Haverá Vida para lá da Vida?

Num momento da minha vida em que tudo se questiona e nada do que era continua a ser, surge este espaço no qual tenciono partilhar com quem por aqui passar um pouco das minhas duvidas, dos meus pensamentos e ideias, esperando que os vossos comentários me ajudem a reencontrar o meu caminho e que os meus pensamentos vos ajudem no vosso... Espero vêr-vos por aqui, neste limbo virtual da vida...

24.11.04

Conceitos - debatendo o amor II

Há dias em que acordo a acreditar na absoluta supremacia e omnipotência do amor... que há alguém no mundo - talvez a nossa alma-gémea ou cara metade - para a qual nós somos o "todo absoluto"; que olha para nós e sabe, sem a menor dúvida, que nascemos para partilhar a vida ao lado um do outro.

Há dias em que acordo a acreditar que, entre os milhares de habitantes do mundo, de alguma forma, o destino há-de trazer aquela pessoa especial até à nossa vida, à nossa porta, por maiores que fossem as distâncias que nos separavam à nascença.

Há dias em que acordo a acreditar que há alguém cujo simples olhar nos deixa as pernas bambas e cujo segurar de mão nos faz sentir a pessoa mais confiante à face da terra; que nos dá a certeza de que, apesar de todas as nossas manias, defeitos e medos, nós somos perfeitos - ou pelo menos, com a força que ela nos dá, o iremos ser...

Há dias em que acordo... e fico à espera que venhas até à minha porta.

17.11.04

Isto é ficção!!

Querídissimos leitores (quando são poucos tem de se tratar bem LOL:)
Ao que parece, quer por comentários escritos que por aqui aparecem (anónimos), quer por outros que me foram ditos directamente, há um ponto que devo esclarecer acerca deste blog: o que aqui escrevo são (ou pelo menos tentam ser) textos literários. Isto quer dizer que são ficção; podem ser baseados em factos da minha vida, da de alguém que conheço ou completamente inventados. Podem expressar os mais profundos dos meus pensamentos ou convições ou apenas terem sido escritos para vos espicaçar... isso vocês nunca saberão. Mas não são, ou não procuram ser auto-biográficos. O que seria de uma escritora se não pudesse usar a imaginação???

Beijinhos e espero continuar a encontrá-los por aqui...

Desencontros

Da primeira vez que a vi trazia uma blusa cingida ao corpo e uns jeans azuis, simples. Nos pés, uns ténis; o cabelo solto, à volta dos ombros.
Movia-se de forma insegura, como quando vamos num caminho de terra solta, com medo de escorregar em alguma pedra.
Olhava as pessoas por quem passava até ao momento em que davam por ela. Baixava então a vista para o chão ou para o relógio.
Sentou-se na mesa ao meu lado. Por companhia um livro de que nunca cheguei a saber o titulo.
Enquanto esperou o croissant e o sumo, fumou um cigarro e leu o que faltava ao livro (o serviço não era lento; o livro estava quase no fim).
A minha conta chegou. Descobri estar já atrasado para o emprego. Numa troca rápida de dinheiro com o empregado levantei-me da esplanada.
*
Dirigiu-se ao balcão naquele seu andar extremamente feminino e entregou-me o talão com o nome do livro que queria requisitar.
Cabelo apanhado num puxinho (como usam as bailarinas), vestido em tons pasteis que adivinhava as linhas do seu corpo.
Tinha um passo incerto, como se tivesse sempre medo, mas isso apenas lhe conferia uma fragilidade sensual, aumentando o seu carisma.
Chamava-se Mariana, trabalhava num escritório de uma firma de construção civil.
Vinha com frequência à biblioteca.
Entreguei-lhe o livro e afastou-se após um rápido “bom dia”.
*
Acabou o livro no momento em que apareceu o criado com o croissant e o sumo.
A seu lado alguém se levantou e afastou em direcção ao parque de estacionamento.
O livro terminara de uma forma brusca. Incompleto, aprofundara a sensação de vazio que ela esperara que fosse atenuada pela leitura.
Comeu rapidamente o croissant; transparecia o desconforto de se encontrar sozinha.
Nessa manhã dera parte de doente no escritório.
Levantou-se e dirigiu-se para a paragem do autocarro. Iria ao cinema.
No final da sessão sentiu uma pungente necessidade de companhia. A noite já se estendia em todas as direcções. O Carlos tinha ido para fora e só voltava para a semana.
Lágrimas escorriam-lhe pela cara.
Deixou-se andar sem destino. Sem reparar no caminho foi ter à ponte.
Olhou as águas, as luzes das ruas reflectidas, o som dos carros que passavam como pano de fundo.
Descalçou-se, despiu os jeans e a blusa. As lágrimas escorriam-lhe de novo pela cara sem que o notasse. Um sofrimento tão intenso e interno, tão sem razão de ser, de existir.
Nua, sentou-se sobre o corrimão.
O escuro, o abismo, a obliteração - o retorno.
O fim absoluto e supremo. Sentia-se atraída, arrebatada.
- Carlos. Eu preciso de ti.
A ponte estava deserta. Pôs-se de pé sobre o corrimão, encostada a um dos pilares.
Queria sentir-se sugada pela não existência.
Deixou-se ir.
*
Vim passear o cão, o Jaime.
Todas as noites o mesmo caminho: saio de casa, viro à direita, seguimos até ao jardim - ele espalha o seu aroma em 15 ou 20 cantos diferentes - continuamos em direcção à ponte, e à saída da ponte viro à direita para entrar pela parte se cima da rua onde moro.
Tínhamos agora saído do jardim e o Jaime vinha com o focinho colado ao chão, quando pareceu ter encontrado qualquer coisa de mais curioso. Parou com o dito focinho enterrado num amontoado de roupas caídas no meio do passeio.
Olhei. Um par de jeans, uma blusa, uns ténis pretos. O soutien voava na estrada.
Não sei que impulso me fez olhar para o rio, mas fi-lo mesmo a tempo de ver um vulto ser engolido pelas águas.
Corri para a cabine telefónica no fim da ponte e chamei uma ambulância.
Foi a segunda vez que a vi.

14.11.04

O assalto (cont.)

No dia seguinte o Rato chegou ao café à hora combinada. Já lá estava o Carlos, na mesma mesa e com 3 finos vazios e um a meio à frente.
- Boa noite.
- Boas.
- Tás pronto? - perguntou o Rato.
- Estou.
- O carro está lá fora, é só fazermos um pouco de tempo.
- Ontem esqueci-me de perguntar uma coisa: que carro é que é?
- Hã?!
- Sabes, pá, é que já não pego num carro há uns mesitos e, prontos, gostava de saber que carro é que é. È que eu não gosto de Renaults.
- É um Opel.
- Um Opel . . .
- Um Corsa, raios. Um dos novos.
- Áh.
Ficaram os dois em silêncio. De vez em quando o Rato olhava para o relógio. Ao fim de umas dez olhadelas disse:
-É melhor irmos pagar que já são 22:30.
Em cinco minutos estavam na bomba de gasolina.
Estava só um fulano a meter gasolina e o vendedor encontrava-se sozinho na loja.
O Rato dirige-se á loja e começa a perguntar os preços dos cachorro-quentes enquanto revira as revistas.
Entra o fulano que estava a meter gasolina e paga.
Cá fora o Carlos acaba de atestar o carro.
Liga o carro e engata primeira.
O Rato, a meio do preço do cachorro simples e do com molho bolonhesa aponta a arma ao vendedor.
O Carlos destrava o carro.
É então que um grupo de jovens, em dois carros e três motorizadas, entra no recinto da bomba de gasolina.
As motas são paradas mesmo em frente à saída para a estrada; os carros, um em frente à porta da loja e o outro imediatamente atrás.
O Rato houve a barulheira lá fora e agarra imediatamente o dinheiro que o funcionário lhe estendia.
Corre para a porta e entra no carro que está em frente a esta - que por coincidência também é um Corsa preto.
O Carlos não está a perceber nada.
-Arranca - diz o Rato para o fulano ao volante
-Olha lá, estás no carro errado.
Apercebendo-se do erro, o Rato aponta-lhe a arma:
-Arranca JÁ !!
O condutor dá-lhe um violento murro que o deixa K.O.
Começam-se a ouvir as sirenes da polícia que o vendedor entretanto chamara.
O Carlos, sem pensar duas vezes, faz marcha a trás, sai pela entrada e passa já a uns 80 Kms/h pela polícia.
Vai para Valença, onde vem a ser preso pelo roubo do carro do primo do Rato pois este, quando soube que o Carlos tinha abandonado o primo à moina não hesitou em apresentar queixa de furto do veículo.

Fim (para os desatentos... hehehe)

12.11.04

O assalto

O Carlos andava desesperado por algum dinheiro.
Já não se lembrava da última vez que tivera uma refeição decente e nem mesmo o dinheiro que ganhava como arrumador lhe chegava para a dose diária de heroina.
De tanto ter emagrecido, as calças ficavam-lhe como se fossem três números acima; a camisa estava rota nos cotovelos e apresentava algumas manchas de sangue aqui e ali (era a melhor camisa que tinha).
Parte da sola das sapatilhas já fora comida pelo asfalto e a barba era a única coisa que ia conseguindo manter decente graças às laminas que encontrava no lixo.
Acho que era por causa do aspecto que já nem dinheiro lhe davam por estar a arrumar carros. É preciso ter em conta que quando digo “arrumar carros” estou a ser um pouco simpático pois ele ficava o dia todo a abanar o braço na mesma direcção, quase só mudando de lugar quando alguém lhe buzinava.
Dava dó de ver.
Depois tudo mudou.
O Rato, um amigo de infância, ofereceu-lhe a oportunidade de participar num golpe que o poria bem na vida durante algum tempo.
Adiantou-lhe algum dinheiro para que ele desse um jeito na aparência.
O Carlos comprou roupa nova, tomou um banho e fez uma refeição decente.
Arranjou uma boa dose de heroina e deu um chuto que o levou até ás estrelas.
No dia seguinte parecia outro.
Encontrou-se às duas no café com o Rato, a fim de acertarem os últimos pontos do assalto:
-É muito simples - dizia o Rato - sabes aquele desacordo que está a haver outra vez entre as bombas de gasolina e os bancos . . .
- Hã . . .
-Por causa dos multibancos e daquela taxa que os gajos querem cobrar . . .
- Tenho andado um pouco desligado - disse o Carlos, como se alguém o não soubesse.
- Bem, não interessa. As bombas de gasolina deixaram outra vez de aceitar multibanco.
Quer dizer que todas as noites estão cheias de massa.
Pois bem, o plano é o seguinte: amanhã à noite, que é véspera de feriado, lá pelas 22:30 (antes de eles fecharam a entrada ao pessoal) vamos, como quem não quer a coisa, ali àquela Shell no centro da vila já que a moina nunca lá passa.
Tu vais a guiar.
- Tá bem.
- Já tás fiche, não estás? O dinheiro que te emprestei já te pôs nos eixos que se nota, não já?
- Hum, hum.
-O.K.
Tu atestas o depósito.
Demoras o tempo que for preciso. Se vires que está muita gente demora mais um bocado.
Metes-te no carro assim que acabares e chega-lo à frente, para junto da porta.
Entretanto eu estou na loja, a fazer de conta que quero batatas fritas ou bolachas ou qualquer outra porra.
Faço que estou muito indeciso para poder demorar o tempo que for preciso.
Quando vir que estás a arrancar digo que quero pagar a gasolina e quando ele me disser que são vinte euros eu saco da arma e peço-lhe o dinheiro todo.
Num instante estamos na via norte e vamos passar o resto da noite em Valença, a curtir umas miúdas e o que mais quisermos.
Percebeste?
- Hum, hum.
- O.K. Encontramo-nos amanhã aqui, lá para as 22:00.
Eu trago o carro do meu primo. . .
Agora tenho que ir trabalhar. Até amanhã.
(cont.)

8.11.04

Não peço
o que não podes dar
e tu
também não o ofereces...

Mas
deixaste cá o teu perfume
e isso
é mais do que aquilo que consigo ter.

Quero-te afastar do meu pensamento
Confuso
Pois nem bem eu sei o que de ti quero.

6.11.04

Indecisão

A água da chuva escorria pela janela da sala.
Sentado no sofá, ingeria programa de televisão um atrás do outro, sem bem ter consciência dos conteúdos ou do porquê de não se conseguir desligar daquilo. Bastava apenas um pequeno toque no botão OFF do comando mental. Desligar do mundo das imagens e ligar o cérebro. Mas era tão mais fácil... simplesmente deixar-se inundar pelas cores e sons, abstraindo a mente de todas as coisas em que não queria pensar...
Constantemente à espera que ela ligasse.
Ou melhor ainda: que, de forma totalmente inesperada, tocasse à campainha.
Mas depois lembrava-se que ela nunca viera a sua casa; provavelmente nunca daria com a mesma sem lhe telefonar a pedir indicações e, isso, iria estragar completamente o momento imaginado pois sabia que ela não o faria. Se nem sequer lhe ligava para, apenas, conversar, porque diabo o faria para saber aonde ficava a casa dele?
"E assim caem as fantasias" – pensou. Que mania irritante de racionalizar tudo... porque não deixar-se embalar um pouco mais na ideia da presença dela: espontânea, fruto de uma necessidade dela de estar consigo...
Ah, mas para isso é que tinha a televisão: para se embalar com a fantasia.
Estava farto daquela vida: todos os fins-de-semana era a mesma coisa, fechado em casa, tentando impedir a entrada do mundo ao mesmo tempo que se afogava em imagens irreais. E depois a segunda-feira, a rotina de há tantos anos, a chegada ao escritório, o trabalho monótono...
Talvez de toda a televisão que consumia (ou por causa dos pacotes de bolachas e batatas fritas que normalmente serviam de acompanhamento) a verdade é que se começava a parecer com o clássico solteirão de meia-idade (apesar de só ter passado as 30 primaveras há dois anos): a barriga estava a ficar pendente demais para que os seus meros 1m73 a pudessem contrabalançar; o cabelo rareava de dia para dia, quase como se cada cabelo que encontrava no ralo da banheira após o banho tivesse morto a raiz ao cair... enfim, não havia nada em si que lhe desse a confiança necessária para fazer uma declaração amorosa...
Não sabia o que fazer para mudar as coisas, para se sentir bem consigo mesmo e ter vontade de fazer alguma coisa que o deixasse de bem consigo mesmo.
Ao voltar da cozinha, uma lata de cola numa mão e um pacote de bolachas na outra, acidentalmente sentou-se em cima do comando da TV, desligando-a. Imediatamente procurou o comando entre as almofadas mas, quando a sua mão o encontrou já havia decidido não a voltar a ligar: "ora, o mundo há-de ser mais do que esta minha vida. Lá dizia o outro: se Maomé não vai à montanha... Vou procurá-la. Está decidido. Hoje vai ser o primeiro dia do resto da minha vida. Espera aí... que horas são?" Olhou para o relógio. 20h58. "Ora bolas, amanhã tenho de me levantar cedo para ir trabalhar... se saio de casa agora vou atrasar o jantar... e às 22h vai dar aquele filme que quero ver... Antes das 21h30 não consigo sair: ainda tenho de me vestir e esperar que o frango esteja cozido... E depois, vou por aí fora e nem sequer sei se ela está em casa. Podia-lhe ligar. Pois, e o que lhe digo? Vou até tua casa pois não consigo mais viver sem ti? A tipa vai achar que sou louco! Enquanto que se aparecer de surpresa... E se ela estiver com alguém em casa? É verdade que já não namora com aquele parvo mas, enfim, uma mulher tão bonita como aquela não há-de ficar muito tempo sozinha... O que é mais uma razão para eu ir e Ups, já são 21h10. Agora é que está mesmo tarde. OK. A partir de amanhã. Semana nova, vida nova. Amanhã será o primeiro dia do resto da minha vida."
Tirou uma bolacha do pacote e ligou a televisão.

3.11.04

a natureza dos sonhos (parte I)

Cresce-se lentamente, os sonhos, regados diariamente por mão meiga, de pai, mãe ou avós. . . desenvolvem em nós a ilusão.
Um dia –talvez durante uma das muitas crises de adolescência - descobre-se que afinal, o mundo não decorre em nosso redor: nós não somos os mais importantes, os mais bonitos ou os mais inteligentes. Nós não somos a personagem principal da história, a do final feliz que derrota os maus, casa com a donzela e, no meio de riqueza e fausto, vive feliz para sempre. Nós somos as figuras secundárias, os figurantes, aqueles por quem a caneta não chega a traçar uma linha ou a câmara não apanha sequer num plano esbatido. E descobre-se que o mundo é todo feito de personagens secundárias que dão cor a uma qualquer história que, talvez, não tenha sequer personagens principais – as tais às quais, mesmo após um ou dois percalços, corre tudo bem. E descobre-se que os tais sonhos, os regados pelos pais, já o não são mais. Chegou a altura de os trocar por um horário das 09h às 18h, igual ao dos pais, os quais nos mantiveram na ilusão de um mundo que nunca existira, nem para eles.
E descobre-se que não se consegue viver sem os tais sonhos. Mas agora, somos nós quem tem de segurar no regador. . . mas ele é tão pesado. . . os pais eram tão grandes . . . com a mesma facilidade com que pegavam em nós com uma mão e no nosso irmão com a outra, fazendo os nossos cabelos voar num corrupio mágico, com essa mesma facilidade davam água aos nossos sonhos.
Agora os pais já não vêm o tal regador. E este cresceu tanto, ou a água não é água mas areia, tão pesado. . .
E quando tentamos regar o rebento, a areia destroi-o sufoca-o em pó, mata-o com o seu peso. Ou então é a nossa falta de jeito que deixa cair o objecto em peso em cima do vaso. ou então, somos nós quem se esquece do pequeno rebento e o deixa minguar, secar, apodrecer.
Talvez um dia, daí a muitos anos, enquanto se explora o sotão das recordações se encontre um vaso pequeno e velho, mesmo escaqueirado. E não nos lembramos para que é que aquilo serviu e deitamos fora, juntamente com todo o lixo que deixámos acumular com o passar das décadas.
Os sonhos podem, de facto, ser vistos como flores.

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